06/07/2007

Venda de Património - Penha de França (#1)

Conforme referido aqui e aqui, é longa a lista de imóveis do Estado a alienar em Lisboa. Esta lista tem obviamente graus diferentes de valor patrimonial, funcional e... imobiliário, e é grande o risco (nos casos em que a venda se concretize) de não haver preocupações de reconversão/reabilitação fora da operação imobiliária-especulativa do costume...

Como cada caso é um caso, falemos de um local menos conhecido, mas aparentemente já em curso – o comando da PSP na Penha de França. Pessoalmente não me "escandaliza" que a PSP saia do local, e parecem-me razoáveis os argumentos de maior funcionalidade com a concentração de serviços da polícia num só local. No entanto, se o Estado vender parte do seu património para se construir um qualquer empreendimento, sem olhar a possíveis oportunidades de requalificar a área envolvente estaremos perante um absurdo – o Estado aliena bens/serviços que servem a comunidade, para se construir posteriormente equipamentos que servem alguns.

A óptica da mera mais valia por via da alienação é grave, de vistas curtas e prejudicial à cidade, e até discutível do ponto de vista económico (com excepção da economia do promotor e construtor, claro). Trata-se de uma oportunidade única e a escolha é simples: criar mais um empreendimento que vive fechado sobre si próprio, que não se integra na área onde está, ou aproveitar para requalificar uma área no centro da cidade, cuja influência é extensível/aproveitável a outras freguesias muito próximas: Anjos, Graça e São João, (que com a Penha de França perfazem cerca de 47 mil habitantes, segundo o INE)

Vejamos a zona da Penha de França:

Esta freguesia (tal como as vizinhas Anjos, Graça e São João) possui um parque habitacional degradado (algum bastante interessante e que consta no inventário da CML), população envelhecida, arruamentos que são mantas de retalho, e tem vindo a perder população jovem que foge dos problemas do costume (especulação, serviços, oferta imobiliária desajustada, etc). Esta freguesia (tal como muitas outras) não se requalifica com uma dúzia de apartamentos novos e caros, cujo parto é fruto de décadas de agonia de um prédio, ou a indecisão/pressão/abandono/desleixo de um qualquer espaço público.

A requalificação desta zona faz-se pela conservação/reabilitação. A atractividade desta e de outras freguesias de Lisboa não se faz deixando prédios a cair décadas à espera do “negócio da vida” para uns, ou tornando um equipamento público obsoleto, para aparecer um negócio imobiliário que diz que vai “requalificar”. A atractividade e o interesse desta e de outras freguesias faz-se maioritariamente pela requalificação do espaço público, em torno do qual se constroem bairros e uma cidade. Para muita gente, viver num bairro com jardins, comércio, escolas faz a diferença, e funciona como factor de retenção ou atracção. A Penha de França tem já alguns equipamentos públicos – um razoável parque escolar, uma piscina municipal, uma biblioteca, centro para idosos, esquadra de polícia, clubes de bairro com actividade(Sporting da Penha, Frassatti, Lusitano da Penha, Alto da Eira, Paróquia activa, etc.)e está muito próxima do centro da cidade. Para melhorar o quadro faltam jardins a sério (o sítio mais parecido é a Paiva Couceiro, e está tudo dito) maior frequência e condições de circulação de autocarros, opções para estacionamento, e pequenas intervenções (arranjo dos passeios, disciplina no estacionamento, maior limpeza),e já agora um cinema ali perto.

A libertação de cerca 7.500 m2 valor calculado a partir daqui (espaço da superfície ocupado pelo comando, sem contar com o edifício do convento) é uma oportunidade única, irrepetível na freguesia, demasiado importante para que se construa ali “qualquer coisa”.

2 comentários:

Anónimo disse...

excelente artigo.

Como habitante da freguesia de S. João, agradeço.

Também ando há nos alertando para esta parte esquecida de Lisboa (talvez a mais esquecida)

Nuno Valença disse...

Pois é Caro Hugo, infelizmente nesta área, apesar do fim de milhares de barracas, há ainda muito a fazer. Pena é também haver muita gente a julgar que requalificação se faz (tal varinha mágica)só com o o projecto do Vale de Santo António...