D. José I e o seu cavalo vão deixar de ser verdes até ao próximo Verão
Por Lucinda Canelas in Público
Os trabalhos de restauro da estátua equestre do Terreiro do Paço começaram há quatro meses e só terminam em Agosto. No fim, e 490 mil euros depois, a estátua deverá ficar cinzento-escura
Lá de cima o Tejo parece ainda maior, mais aberto. Há 236 anos que D. José I tem aquela vista do rio. Agora, rodeado de andaimes, conta também com os técnicos de conservação que estão a estudar e restaurar a sua estátua equestre, uma criação do escultor Joaquim Machado de Castro, inaugurada no 61.º aniversário do rei (6 de Junho de 1775), quando a cidade estava ainda a ser reconstruída e o arco da Rua Augusta não existia. Da plataforma junto às patas do cavalo é hoje difícil imaginar um Terreiro do Paço sem os edifícios amarelos concluídos - para a festa de anos de D. José foi preciso construir uns a fingir, como num cenário de ópera.
O restauro da estátua, a obra mais importante daquele que é considerado o maior escultor português, começou em Agosto e deverá prolongar-se até ao Verão. António Costa, presidente da Câmara de Lisboa, visitou ontem o estaleiro da Nova Conservação, a empresa que está a executar os trabalhos orçados em 490 mil euros e financiados pelo braço português da World Monument Fund (WMF), uma organização privada que se dedica à preservação do património.
De capacete e máquina fotográfica, o autarca percorreu as plataformas dos andaimes, atento a cada detalhe do conjunto. "A riqueza decorativa que a estátua tem demonstra bem a importância deste restauro", disse aos jornalistas, falando do projecto que vai tirar ao rei e ao seu cavalo a pátina verde que hoje têm como "uma das últimas obras" da Praça do Comércio. Depois de concluída, explicou, ficam a faltar as fachadas dos edifícios, a iluminação que dará à praça a leitura cénica que merece e a instalação de um elevador no Arco da Rua Augusta. O autarca quer que esta comece já no próximo ano.
Os trabalhos a cargo da WMF, entidade que já esteve envolvida no restauro de dois dos mais importantes monumentos portugueses, a Torre de Belém e o Mosteiro dos Jerónimos, fazem parte de um programa mais vasto dedicado ao escultor, que incluiu uma grande exposição no Museu Nacional de Arte Antiga e um colóquio internacional organizado pela Universidade Autónoma.
É José Ibérico Nogueira, coordenador do projecto pela WMF, quem explica os principais problemas de conservação da estátua, uma maravilha da técnica no século XVIII: 35 mil quilos de metal que levou 28 horas a derreter e apenas sete minutos e 53 segundos a verter para a forma (tudo curiosidades que se podem ler no tapume da obra). "A poluição do trânsito e a salinidade, com o rio aqui ao pé, foram corroendo os materiais e cobrindo a pedra e o metal de manchas, dando à estátua aquela coloração verde que a do Marquês [de Pombal] tinha antes do restauro", explica ao PÚBLICO, colocando muitas reservas à possibilidade de alguma vez ter sido dourada, hipótese recentemente levantada.
"As estátuas dos monarcas franceses eram muitas vezes folheadas a ouro, para manter o dourado, o que não aconteceu aqui", diz, acrescentando que o Terreiro do Paço era à data conhecido na Europa como a Praça do Cavalo Negro. Nuno Proença, o técnico da Nova Conservação que dirige a obra, diz que é ainda muito cedo para tirar conclusões quanto ao aspecto que a estátua teria. "O que podemos dizer, com base num relatório do Laboratório Nacional de Engenharia Civil que já tem alguns anos e nos estudos que estamos a fazer, é que não é de bronze, como [o próprio] Machado de Castro escreve."
A estátua equestre do monarca, peça central da revitalização da cidade pós-terramoto, tem uma estrutura interna em ferro, com seis toneladas, e é feita em latão almirantado, "uma liga metálica composta por cobre, estanho e alumínio, muito usada nas embarcações", explica o coordenador de projecto da WMF. "Com tamanha concentração de estanho, dificilmente teria um aspecto dourado." Ibérico Nogueira diz que o mais provável é que fosse em cinzento-escuro, "muito semelhante ao que tem hoje a do marquês". E é a essa cor que deverá voltar em Agosto.
Até lá, muitos estudos e trabalhos estão ainda previstos. Antes do fim do mês, por exemplo, vai ser feita uma endoscopia ao cavalo, explica Proença: "Vamos introduzir-lhe uma sonda através de um buraco na barriga para avaliar a estrutura que, em princípio, não apresenta grandes problemas de estabilidade". Terá sido através desse furo que na anterior intervenção de limpeza (foi feita uma em 1926 e outra em 1983) foram retirados três mil litros de água que nela se tinham infiltrado.
Com o restauro e os estudos a ele ligados poderão acrescentar-se elementos à leitura do programa iconográfico desta obra de Machado de Castro. Por que insistiu ele em pôr uma coroa de louros sobre o elmo de D. José? Será uma pequena vingança por não o terem deixado vestir o rei como se fosse um imperador romano? Provavelmente nunca viremos a saber.
2 comentários:
Vê-se mesmo que o Sporting já era...
Xico,
quando não tem nada a contribuir porque sente necessidade destes comentários pueris que não têm o mínimo de graça, apesar da sua presunção?
Não dizer nada é um mais, sabe?
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