05/11/2013

Lisboa. Só as zonas turísticas vão ficar com a calçada portuguesa


In I Online (5.11.2013)
Por Francisco Castelo Branco

«Câmara já arrancou com o estudo para substituir a calçada por pavimento "mais acessível" aos idosos, mas garante que nas zonas históricas fica tudo como está


As pedras da calçada estão a desaparecer no bairro do Sacramento em Lisboa. É só o início de uma mudança ainda maior que está para breve. Substituir o piso de uma boa parte dos passeios da capital é uma promessa eleitoral que o presidente da câmara, António Costa, promete agora cumprir. A "fase de estudo" já arrancou e o objectivo da autarquia é encontrar as soluções mais adequadas para trocar a tradicional calçada portuguesa.

A mudança nunca será pacífica, já que haverá sempre alguém disposto a defender uma "marca lisboeta única", como Nuno Alvarenga, cozinheiro de 51 anos. A relação dos lisboetas com a calçada, no entanto, ainda é "um misto de amor e desprezo", explica o olisipógrafo Appio Sottomayor: "Se a autarquia decidisse arrancar algumas pedras, não faltaria quem protestasse." A mudança que aí vem, porém, não será radical, assegura fonte do gabinete de António Costa. Para os moradores mais preocupados, o executivo da câmara municipal esclarece que nas zonas turísticas fica tudo como está. A substituição da calçada por outros pavimentos "mais cómodos e acessíveis" servirá para facilitar a deslocação dos idosos e da população com fraca mobilidade.

A questão aqui, contudo, é que a calçada faz parte do quotidiano dos lisboetas. Apesar de perceber que as pedras de calcário e basalto têm alguns inconvenientes para quem usa os passeios, Nuno Alvarenga, que vive na Rua de São Bento, tem receio que a "marca identitária desapareça da cidade". Appio Sottomayor é mais uma voz a favor da calçada portuguesa. E avisa já que o carro tem sido o seu principal inimigo: "Sua majestade o automóvel tem prioridade sobre tudo." O especialista em história da cidade de Lisboa vai mais longe e deixa um alerta: "Com o pára-arranca e o peso dos carros sobre os passeios, as pedras soltam-se rapidamente e os desenhos desfazem-se num instante. O que é uma pena."

CALCETEIROS Não é só a calçada lisboeta que está em risco. A formação de calceteiros também está a ser afectada com os tempos de austeridade. As autarquias investem cada vez menos em novas empreitadas, conta o calceteiro Miguel Gouveia. E, se a procura é baixa, os novos formandos também têm consciência de que estes cursos têm pouca empregabilidade, explica.

No entanto, Miguel Gouveia acredita no futuro e está convencido de que "haverá sempre mestres artistas a trabalhar na calçada". Até porque são os jovens entre os 20 e 30 anos que têm mais interesse em entrar na escola de calceteiros. É também por isso que o formador não desiste. Miguel Gouveia pretende incutir nos mais novos o gosto pelo ofício: "A parte mais gratificante do meu trabalho é quando começo a reparar que a arte surge no formando, e aí vejo que a minha alma está naquele jovem." Essa é portanto uma das razões para acreditar que haverá sempre mestres especialistas a sair das escolas. E esta arte precisa de bons profissionais que saibam executar as várias técnicas que o ofício exige. A mais popular é a calçada portuguesa, com uma orientação de 45 graus face à esquadria da obra.

Mas há outras formas de desenhar a pedra sobre o chão. Os mestres calceteiros distinguem a calçada à portuguesa, o malhete, a calçada a fiada, a calçada circular, a calçada sextavada, o leque segmentado e o leque florentino. São os próprios mestres que criam e desenvolvem novos tipos de piso, consoante os seus gostos e estilo profissional. Em geral, a calçada mais apreciada é a artística.

Mas a calçada não tem só pontos fortes. O seu lado mais fraco é o betume, que, não sendo de cimento, faz levantar muitas pedras. O mestre Miguel Gouveia não tem dúvidas em afirmar que a calçada portuguesa tem a ver com arte, tradição e património urbanístico. O resto são "modernices", que apesar de tudo não põem em risco o futuro da calçada tradicional portuguesa, remata o calceteiro.

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Ok, mas zona histórica é o Miradouro de Santa Catarina, certo? E a Rua da Vitória?

13 comentários:

Anónimo disse...

Ah, por isso então é que na Ribeira das Naus colocaram aquele lindo pavimento preto e incómodo!!!

Finalmente, a explicação.

Anónimo disse...

Se os passeios são para os automóveis, o que interessa esta mudança?

Manuel Marques disse...

É isso mesmo!!! Colocar aquele piso horroroso que está a ser colocado na zona das passadeiras das avenidas novas! E a identidade da cidade fica onde?

Anónimo disse...

A rua da vitória então não dá para perceber! Uma rua em plena Baixa!!! Se ainda fosse uma rua inclinada, com o pretexto de ser um local onde muitos idosos escorregam e tal... mas não!!! É assim mesmo, é colocar piso daquele e candeeiros em palito por todo o lado! Quem faz isto não pode gostar desta cidade!

Anónimo disse...

Com Vossa licença, lá pela CML anda tudo louco. No "reabilitado" parque de estacionamento do Corpo Santo, os carros passaram a estacionar sobre um GRAVILHA NEGRA. Como se mete pelos olhos dentro, com as manobras feitas para parquear, a gravilha nunca se aguentará onde foi colocada e, além disso, não se vislumbra de todo como tencionam fazer a limpeza daquele piso. Como é possível que tenha passado pela cabeça de alguém aquela "solução"?

Anónimo disse...

Até retiraram o monumento ao calceteiro da Rua da Vitória! Alguém sabe para onde foi?!

Anónimo disse...

A julgar pelo respeito que a Câmara dá ao património, zona histórica deve ser uma zona muito restrita!


Talvez não mais do que a Baixa, o que é uma pena...

Provavelmente se em vez de acabarem com ela, invistissem no seu tratamento, os problemas resolver-se-iam.

É que destruir todos os passeios de Lisboa será caríssimo, não?!
Péssima ideia, mas um pouco da identidade que nos tiram.

O que sobrará?!

Xico205 disse...

Deve ficar barato deve. E ando eu a pagar para isto. Que saudades do Estado Novo.

Filipe Melo Sousa disse...

Até que enfim que Portugal se começa a tornar civilizado. Já era altura de acabar com esta calçada antiquada, inestética, incómoda, cara e anti-higiénica.

Anónimo disse...

Para estes sujeitos a zona histórica é de Olaias até à Penha de França!

A Ribeira das Naus
O Terreiro do Paço
O Mirdouro de SC
A Rua da Vitória
E outras tantas....não passam de "montras" e zonas para especular!

Anónimo disse...

Ouvi dizer que para agradar aos Sousas deste mundo até o calçadão do Rio de Janeiro vai ser substituido por cimento.

Anónimo disse...

Ainda ontem estava a ver na televisão uma entrevista a uma realizadora francesa que cá realizou um filme. Disse ela que a única coisa que pediu ao diretor de fotografia foi que filmasse em cenários de pedra. Pedra dura, verdadeira, forte, nada de betão. E conseguiu. Algures encontrou uma calçada, uma rua de pedra, com um muro em pedra e ficou lindo.

Isto serve tão somente para demonstrar um outro lado do contributo da calçada portuguesa e do ambiente lisboeta. Tirar as calçadas e deixar só no turismo é ridiculo. Ainda mais se tirarem onde elas nunca causaram problema algum para as substituir por outras que são feias e causam problemas.

Em termos culturais não existe produtor que goste de filmar em locais turisticos. Gostam é de encontrar cantinhos deliciosos, cheios de identidade e energia. Lisboa está cheia deles mas a levarem isto adiante vão deixar de existir. E para quê? Para quê? Pretexto para desviar dinheiro?

Filipe Melo Sousa disse...

Também o Michael Jackson disse que só queria filmar numa favela, e foi ao Rio de Janeiro para isso. Motivo de orgulho?